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A incorporação de sociedades e de ações

Têm surgido na mídia críticas às legítimas operações de reorganização societária de companhias abertas, especialmente quando elas implicam em alterações de controle acionário de sociedades que participam da reorganização.

Autor: Luiz Leonardo CantidianoFonte: Valor Econômico

Têm surgido na mídia críticas às legítimas operações de reorganização societária de companhias abertas, especialmente quando elas implicam em alterações de controle acionário de sociedades que participam da reorganização. Segundo alegam os críticos, essas operações, porque objetivam permitir a transferência do controle de uma sociedade que é reestruturada, violam a lei - na medida em que não obrigam a apresentação de oferta pública de aquisição de ações ordinárias em circulação no mercado (OPA) de propriedade dos acionistas não controladores - e deveriam ser vedadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), enquanto órgão regulador do mercado de valores mobiliários.

Não desconhecem, aqueles que formulam essas críticas, o fato de que a reestruturação societária, prevista e regulada na legislação vigente, se presta, fundamentalmente, a permitir a concentração empresarial, servindo, ainda, para possibilitar a reorganização de empresas que atravessam dificuldades patrimoniais - entre outras razões por falta de recursos, defasagem tecnológica, falta de escala e má-gestão. Concluídas essas reestruturações, essas companhias conseguem superar seus problemas e crescer, preservando empregos, pagando impostos e contribuindo para o desenvolvimento econômico do país.

Não há na legislação - é importante registrar - uma regra que imponha a mudança de controle de uma companhia exclusivamente por intermédio de uma operação privada de aquisição do bloco de ações que assegura a uma pessoa, ou a um conjunto de pessoas, o exercício do controle da companhia. Se é verdade que a lei assegura aos acionistas não controladores da companhia aberta o direito de receber uma oferta pública para a venda de suas ações por um preço que corresponda a 80% do que tiver sido pago pela aquisição do bloco de controle, não menos verdadeiro é o fato de que a lei não restringe a alteração do controle de uma companhia aberta a uma operação de alienação do bloco de ações que assegure a seu titular o poder de comandar os destinos da empresa.

Portanto, os críticos não podem pretender que os empresários e os investidores - que desejam preservar as empresas nas quais participam, ou nas quais desejam investir recursos novos - sejam obrigados a realizar operações privadas de aquisição do bloco de controle de uma companhia aberta quando a realidade do mercado lhes oferece alternativas diversas para atingir os objetivos que eles pretendem obter.

Se é razoável entender o interesse, daqueles que formulam as críticas, de procurar maximizar seus investimentos por meio da alienação de ações quando lhes for formulada uma OPA, é inquestionável o direito que empresários e investidores têm de buscar a melhor estrutura de negócio que, sem prejudicar os direitos dos investidores, lhes possibilite alcançar as finalidades que desejam almejar: preservar a empresa, mais capitalizada, detendo tecnologia mais moderna, agregando novos negócios às linhas de produção já detidas e alcançando uma escala que lhes proporcione melhores condições de atuar em um mundo cada vez mais competitivo.

Estou absolutamente seguro de que é uma completa inversão de valores e de princípios fazer com que os investidores - que apenas buscam preservar seus interesses pessoais, também legítimos - tenham o direito de determinar a estrutura de operação que possa resultar em uma mudança de controle das companhias abertas, ainda que em prejuízo daquelas companhias e daqueles que pretendam continuar sendo seus acionistas. Quem determina a vontade da sociedade por ações é o acionista, ou o grupo deles, que detém a maioria de seu capital votante. Cabe ao acionista majoritário, portanto, à vista do interesse da companhia, definir a estrutura a ser adotada em uma operação que, no seu entendimento, sirva para desenvolver a empresa, tornando-a apta a superar suas dificuldades momentâneas e até mesmo a alcançar melhores condições para enfrentar a concorrência.

Todos sabem que a apresentação de uma oferta pública, constante do artigo 254-A da Lei nº 6.404, de 1976, tem por objetivo assegurar, aos minoritários das companhia aberta, titulares de ações ordinárias, uma participação no prêmio que, regra geral, é paga ao alienante das ações de controle. Naquelas situações em que o controlador de companhia aberta identificar, seja por quê razão for, a oportunidade de realizar uma transação que envolva a reestruturação da companhia que comanda, e decidir realizá-la através de uma incorporação (ou incorporação de ações) que resulte em uma modificação do controle de uma das companhias, é inquestionável que ele não pode ficar impedido de concretizar a operação que melhor atenda os interesses sociais pelo fato de, assim fazendo, frustrar o desejo que tem o minoritário de ser destinatário de uma OPA.

Concluindo, é certo que a realização de uma reestruturação não prejudica o minoritário da companhia que é incorporada, ou que tem as ações de sua emissão incorporadas por outra.

Luiz Leonardo Cantidiano é advogado e sócio do escritório Motta, Fernandes, Rocha Advogados e ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM)