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Riscos culturais em contabilidade

Como a evolução é a lei natural, o retroagir cria sempre um período de penumbra no processo do conhecimento, quando não termina por ser mesmo uma total escuridão.

Autor: Antônio Lopes de SáTags: contabilidade

Informar sobre a riqueza dos empreendimentos é tarefa contábil, mas, requer, para tanto, respeito a disposições racionais que guiam a pertinente disciplina.

O que entender sobre os fatos sucedidos, como determinar atributos, julgamentos e por conseqüência conceitos é algo que demanda cultura, inteligência, racionalidade, atualização.

Entretanto, algumas vezes o referido como “inovação” tem sido em realidade retrocesso.

Como a evolução é a lei natural, o retroagir cria sempre um período de penumbra no processo do conhecimento, quando não termina por ser mesmo uma total escuridão.

Em razão dessa verdade foi que o cognominado pai da Química Moderna, Antoine Laurent de Lavoisier (1743 - 1794), intelectual famoso dos fins do século XVIII, advertiu na Introdução de seu "Tratado Elementar de Química", que "da palavra deve nascer a idéia" e a "idéia deve ater-se ao fato"; a importância dessa máxima está diretamente associada àquela da grande inteligência do autor e do que a obra representou para a ciência.

Essa expressiva lição, acolhida, no passado, por gênios do conhecimento é ainda a que eminentes pensadores contemporâneos sustentam em suas obras (veja-se, por exemplo: MARITAIN, Jacques - A ordem dos conceitos, Lógica Menor - 13a. Edição Agir, Rio de Janeiro, 1995); a verdade não tem idade por que se situa acima dos tempos e dos espaços.

No encalço de um posicionamento racional sobre a concepção das evidências patrimoniais, através dos balanços, em Ativo e Passivo, na busca do verdadeiro significado, foi que se realizaram esforços intelectuais desde remotos tempos; emitir conceitos é uma responsabilidade da razão humana.

Só, no entanto, no século XX, quando o positivismo já consolidara seu lugar no progresso das ciências, que em Contabilidade o russo Leo Gomberg produziu em 1903 adequado entendimento sobre a questão, na obra “Einzelwirtschaftslehre”.

Conceituou o Ativo como o efeito da “aplicação de capitais próprios ou de terceiros”.

Tal definição, logo a seguir foi adotada na obra sobre a “filosofia das contas”, de Charles E. Sprague, editada em 1907 (várias vezes reeditada em New York pela Ronald Press sob o título “The Philosophy of Accounts”) quando esse autor reforçou a tese de que se faziam necessárias concepções rigorosamente lógicas para o entendimento contábil; quer na Europa, quer na América, portanto, o conceito referido prosperou, por representar a realidade constatada.

As escolas científicas italianas, firmando-se no materialismo contábil nascido em 1840 com Villa, mesmo perante os abalos do personalismo de Cerboni, a partir de um renascimento doutrinário adotado pela escola de Veneza, a partir da década de 30 do século XX, aderiram integralmente à concepção de Gomberg.

O rigor lógico, a verdade contida no conceito de Ativo como “efeito”, “aplicação” ou “investimento” por axiomática tem prevalecido, ressalvado o que alheio à ciência tem fluido do empirismo, de normas produzidas por entidades particulares.

Fato incontestável é que não existe “geração espontânea” em matéria física, orgânica, nem patrimonial que pudesse ter sido demonstrada até os nossos dias; investimentos são frutos de capitais que os ensejam, ou seja, o recurso é uma precedência e o ativo uma conseqüência sob a ótica da estrutura patrimonial.

Definir, pois, Ativo como “recurso” fere ao princípio lógico de causalidade adotado universalmente pelas ciências, logo, também, uma lesão à racionalidade.

Admitir como possível formar patrimônio sem que exista suporte de uma origem é fantasiar ou falsear, blindando a inverdade.

Ensinar, partindo de conceito falso é condenável, aético, desumano.

O risco cultural está exatamente em deformar mentes pelo ensino mal guiado, pela opção por falácias como se realidades pudessem ser.

Adotar, pois, o conceito de Ativo como sendo este um “recurso” é retroceder um século; a idéia expressa pela palavra é responsável pela identificação dos julgamentos, estes que no caso devem exprimir relação de identidade entre dois termos, fundamentada na experiência da constatação perante a causalidade.

Se o que se exprime é uma ordem de equilíbrio de conjuntos de valores, como é o caso do Balanço, o envolvimento entre as partes (Ativo e Passivo) deve ser considerado em face da essência que é a riqueza patrimonial.

Recursos são as causas, ou seja, os suprimentos de capital, tanto de origem própria, quanto através de dívidas e isso é o que evidencia o identificado na outra face do balanço que impropriamente, “lato sensu”, se denominou como Passivo.  


*Autor: Antônio Lopes de Sá

www.lopesdesa.com.br

Contato: lopessa.bhz@terra.com.br

Doutor em Letras, honoris causa, pela Samuel Benjamin Thomas University, de Londres, Inglaterra, 1999 Doutor em Ciências Contábeis pela Faculdade Nacional de Ciências Econômicas da Universidade do Brasil, Rio de Janeiro, 1964. Administrador, Contador e Economista, Consultor, Professor, Cientista e Escritor. Vice Presidente da Academia Nacional de Economia, Prêmio Internacional de Literatura Cientifica, autor de 176 livros e mais de 13.000 artigos editados internacionalmente.